Entre os motivos que mais podem levar estudantes a abandonar a graduação na UFBA estão a falta de suporte para continuar os estudos – que resulta, por exemplo, na impossibilidade de conciliar a rotina de aulas com a jornada de trabalho – e a indecisão sobre se estavam ou não escolhendo a profissão certa. É o que aponta uma pesquisa de mestrado que analisou uma amostra de alunos que desistiram de cursos de graduação na modalidade progressão linear da Universidade.
O trabalho – intitulado Evasão de discentes: um estudo na Universidade Federal da Bahia, realizado por Uendel Cruz, sob a orientação do professor Roberto Brazileiro, no Mestrado Profissional em Administração do Núcleo de Pós-graduação (NPGA) da Escola de Administração – também caracterizou o perfil dos alunos que abandonaram a graduação na UFBA: em sua maioria, os evadidos são do sexo masculino, com idade entre 28 e 37 anos; estão na segunda graduação, apresentando rendimento acadêmico abaixo do exigido pela instituição; e abandonaram o curso nos quatro primeiros semestres.
A título de dimensionamento da evasão na UFBA, dados do Ministério da Educação revelados pelo site Poder 360 em outubro (e que não fazem parte da pesquisa) indicam que a taxa de evasão na Universidade foi de 9,2% em 2018, a oitava mais baixa entre as federais, e bem abaixo da média nacional no mesmo ano, de 15,2%.
A dissertação aponta também que o maior número de desistências aconteceu em cursos das áreas 1 (Ciências Exatas) e 3 (Ciências Humanas), com 35,4% e 31,8% de evadidos, respectivamente. O menor percentual de abandono na amostra estudada foi observado na Área 5 (Artes), que apresentou evasão média de 5%, aponta a dissertação, disponível no Repositório Institucional da UFBA.

Dados que mostram a evasão por área, retirados da pesquisa “Evasão de discentes: um estudo na Universidade Federal da Bahia”.
O estudo realizado por Cruz, que é servidor técnico-administrativo na Superintendência de Desenvolvimento Institucional (Supad), tomou como referência uma amostra de 359 alunos, obtida a partir de levantamento realizado pela Superintendência de Tecnologia da Informação (STI), mediante autorização da Superintendência de Administração Acadêmica (Supac). Foram considerados como evadidos, aqueles que não estavam inscritos em nenhuma disciplina por mais de dois semestres consecutivos, no período dos últimos cinco anos, contemplando os semestres entre 2014.1 a 2019.1.
De acordo com pesquisador, “a coleta dos dados foi feita por meio da escala Motivos de Evasão no Ensino Superior (M-ES) e enviada por meio de questionário online pela plataforma SurveyMonkey, contendo questões fechadas, cuja interpretação valeu-se do método estatístico de Análise de Classes Latentes (LCA)”.
Uma análise aplicada do estudo indica que a maior incidência de evasão na UFBA registra-se, comprovadamente, entre aqueles que, já tendo concluído uma primeira formação superior, buscam cursar uma segunda graduação e, como não conseguem conciliar as atividades acadêmicas com a vida profissional, optam por abandonar o curso. Para remediar essa ocorrência, a pesquisa sugere que a Universidade adote estratégias que visem a ampliar a oferta de cursos noturnos.
Segundo a pesquisa, a evasão não é prevalente entre os estudantes que buscam sua primeira formação profissional, muito embora boa parte deles necessitem de apoios diversos para continuar estudando, já que não têm fonte de renda. Para esses casos, a política de ações afirmativas da UFBA oferece variadas modalidades de assistência (leia mais abaixo), que, contudo, carecem de incremento orçamentário por parte de Governo Federal para que possam ser ampliadas.
O pró-reitor de Ensino de Graduação, Penildon Silva Filho, aponta a inexistência de dados mais completos sobre a evasão nas universidades brasileiras como maior empecilho a uma compreensão mais aprofundada do fenômeno. “Existe uma fragilidade nos dados sobre evasão, uma impossibilidade de ter uma conclusão definitiva sobre esse fenômeno (…) Carecemos de um sistema que possa garantir o acompanhamento com mecanismo de controle da reentrada nessa mobilidade que existe hoje”, defende. Desde 2014, Silva Filho integra o Colégio de Pró-reitores de Graduação das Universidades Federais (Cograd), que discute com o MEC a necessidade de um sistema para identificar o trânsito dos estudantes por meio do acompanhamento do CPF (leia mais abaixo).

O pesquisador Uendel Cruz (camisa rosa) junto com os membros da banca que referendou sua pesquisa de mestrado: à esquerda, o orientador, Roberto Brazileiro (EADM/UFBA) e à direita, Elisabeth Loiola (EADM/UFBA) e Marcos Gilberto dos Santos (IFBA).
A dissertação, defendida no último mês de outubro, enfatizou a situação de “indecisão [sobre] se está ou não no curso e na profissão certa” e apontou a necessidade de realização de acompanhamento vocacional dos recém-ingressos – conclusão que já está em conformidade com as estratégias que alguns cursos da Universidade já adotam na prática.
Estratégias para retenção e permanência dos estudantes
Assistência estudantil, orientação acadêmica e processo seletivo para a ocupação de vagas residuais estão entre as principais estratégias adotadas pela Universidade Federal da Bahia para reduzir a evasão em seus cursos de graduação. As medidas também visam a aumentar a retenção dos estudantes de graduação, observando à diretriz estratégica número 3 do Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI), que traz como metas a redução da evasão em pelo menos 20% e a ampliação da taxa de conclusão, também em 20%, nos cursos de graduação, até o ano de 2022.
De acordo com a pró-reitora de Assistência Estudantil e Ações Afirmativas da UFBA, Cássia Virgínia Maciel, “o papel da política de assistência estudantil tem o objetivo de colaborar para a permanência dos estudantes. E nossa Universidade tem uma política ampla, que atende 10 áreas e conta em média com 20 modalidades de apoios, financeiro ou não”.

A Proae gere uma política ampla de assistência estudantil, que atende 10 áreas e conta em média com 20 modalidades de apoios.
Cássia ressalta que “as modalidades de assistência envolvem bolsas, serviços, auxílios e apoios, principalmente ações prioritárias que estão ligadas à moradia (com quatro residências universitárias e auxílio financeiro para moradia); transporte (serviço do Buzufba com vários ônibus circulando entes os campi) e alimentação (restaurante universitário e dois pontos de distribuição no canela e auxílio financeiro para refeições). Além disso, há outros auxílios financeiros para despesas de saúde como medicamento e óculos e participação e realização de eventos”.
Visando a apoiar a continuidade dos discentes, também existem editais para concessão de bolsas, mediante os programas Permanecer e Sankofas, além de uma creche. A pró-reitora ressalta que “a assistência estudantil na UFBA também vem sendo tratada como elemento transversal em todas as suas áreas – pesquisa, ensino e extensão”.
Outro expediente que vem sendo usado tendo em vista à retenção é a orientação acadêmica. Segundo o pró-reitor Penildon Silva Filho, a prática enfrenta alguns dos motivos de desistência que são apontados em recente pesquisa da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior Andifes), como a dificuldade do aluno em ter um método de estudo/aprendizagem próprio, que atinge 33% do alunado, além das questões socioeconômicas para 30%.
Algumas unidades da UFBA – como as faculdades de Medicina e Veterinária, o Instituto de Matemática e as escolas de Administração e de Dança – já implantaram serviços de orientação acadêmica, processo do acompanhamento do aluno feito por um professor orientador, para ajudar no momento de escolha das disciplinas para matrícula semestral e também na busca de alternativas de assistência estudantil, pesquisa, atividade de extensão e aconselhamentos profissional, acadêmico e pedagógico. “A orientação já existe há algum tempo, mas estamos num esforço de expansão, e a Prograd está estimulando todas as unidades a adotarem esse sistema”, disse o pró-reitor.
Junto com essas medidas, também há um trabalho global de valorização dos cursos, aumento da autoestima dos professores e acolhimento dos alunos para melhorar a retenção na Universidade, informou Penildon. Há divulgação específica, realizada para o público do ensino médio, a exemplo do UFBA Mostra Sua Cara, evento que apresenta os cursos ao público secundarista, a fim de que futuros alunos em potencial da Universidade façam escolhas mais conscientes.
Mesmo com estratégias contra a evasão, alguns estudantes ainda desistem de seus cursos de graduação e a UFBA busca preenchê-las com o aproveitamento das vagas residuais, mediante processo seletivo específico, para o qual é publicado um edital anualmente.
Mobilidade e reentrada nas IES

Penildon Silva Filho, pró-reitor de Ensino de Graduação: “o fenômeno da evasão é internacional e não é recente”.
_O pró-reitor Penildon Silva Filho apontou que, embora persista, “o desafio de combater a evasão persiste na UFBA […] não é algo novo”. Ele lembrou documentos do Fórum Nacional de Pró-Reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis (FONAPRACE), da década de 1990, que já apontavam a existência do problema, em todas as instituições de ensino superior (IES). “O fenômeno também não foi iniciado pela expansão das universidades federais no Brasil com o Programa do Governo Federal de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais Brasileiras (Reuni), a partir de 2007, e nem devido à adoção do Sistema de Seleção Unificada (Sisu), desde 2010. [É algo que] existe há tempos [tanto aqui como] nas instituições da Europa e nos Estados Unidos”, completou o pró-reitor.
Silva Filho afirma que “uma consideração mais profunda [sobre a evasão] indicará que está ligada à mobilidade e reentrada entre cursos do sistema de ensino superior”. O pró-reitor explica que “a maior parte dos alunos que evade não é identificada, então, não é possível falar sobre evasão com os dados que temos hoje, pois não estamos descontando dessa evasão os alunos que saem de um curso e entram em outro”. Assim, muitos desses alunos “não são evadidos, eles apenas trocaram de curso e irão concluir um outro [na UFBA ou] até mesmo numa outra instituição”. A imprecisão pode ser atribuída, afirma, à “ausência de acompanhamento dos alunos do ensino superior, pois nem o sistema das universidades e nem do MEC conseguem identificar os estudantes que saem de um curso para outro dentro da UFBA, ou que saem de um curso da UFBA e entram numa outra universidade”.
Silva Filho defende ainda que a mobilidade acadêmica e profissional – fenômeno brasileiro e mundial, ele salienta – não são levadas em conta quando são calculadas as taxas de evasão. Para o pró-reitor, um dos fatores que contribui para a evasão pode ser “a falta de maturidade da maioria dos estudantes, que ainda são muito jovens e não têm discernimento para definir sobre a vida acadêmica, percurso formativo e profissão para o resto da vida. Muitos mudam de curso e de universidade, se formam e trabalham em áreas distintas. E há também outros que se formaram e que, depois, voltam buscando uma segunda formação”. É justamente esse último perfil o que mais corresponde ao encontrado pela pesquisa de Uendel Cruz.
O pró-reitor destaca ainda que “os cursos não devem ser analisados individualmente sobre os que têm mais ou menos evasão, mas de acordo com sua relevância social. Temos cursos que não necessariamente terão muitos alunos, pois, objetivamente, alguns deles têm uma procura social maior. Mas uma sociedade desenvolvida não abrirá mão dos seus cursos das áreas de artes, letras e música”, finalizou.