Nina Fernandes dos Santos, professora substituta na Faculdade de Comunicação da UFBA (Facom) e pesquisadora do INCT Democracia Digital, foi premiada por sua tese de doutorado, defendida em 2019, na Universidade Panthéon-Assas/Paris II, uma das instituições que compõem a Universidade Sorbonne, na França.
Escolhida entre as melhores no ano, a tese tem como tema o uso do Twitter e a reconfiguração do ecossistema de comunicação durante os protestos de 2013 no Brasil. Foi realizada no Centro de Análise e Pesquisa Interdisciplinar sobre os Media, sob orientação de Cécile Méadel.
O estudo busca entender como as redes sociais impactam o sistema de comunicação brasileiro e suas implicações para os meios de comunicação tradicionais, explica a professora. Foram abordados ainda temas como mídia-ativismo e movimentos de protesto. A pesquisa baseou-se em entrevistas com jornalistas, ativistas, atores políticos e de comunicação durante os protestos de 2013 no país, e na análise de um conjunto de 97 mil tuítes coletados naquele ano com a hashtag “vemprarua”, cedidos pelo Laboratório de Estudos sobre Imagem e Cibercultura da Universidade Federal do Espírito Santo.
De acordo com Nina Santos, os resultados apontam um grande volume de manifestações em relação aos meios de comunicação de massa, seja por seus conteúdos ou posicionamentos, destacando-se menções negativas oriundas dos diversos espectros políticos. Naquele momento, a mídia era acusada tanto de incentivar como invisibilizar os protestos, recorda.
A professora ressalta o entusiasmo inicial com as redes sociais e a expectativa de impulsionar revoluções para derrubar governos autocráticos, como no caso do movimento que ficou conhecido como Primavera Árabe. Mas essa percepção mudou com a eleição de governos de extrema direita em várias partes do mundo e a propagação de fake news nessas mesmas redes, conforme observa. “O ambiente não é bom e nem ruim por essência”, afirma Santos, que defende que as pessoas devem responder pelos crimes cometidos em ambientes virtuais e considera que mídias sociais abrem espaços importantes para muitas vozes, inclusive para os movimentos sociais.
O estudo reflete também sobre a mediação exercida pelas redes sociais, através de algoritmos, organização e indicação de conteúdos que influenciam nas dinâmicas de visibilidade. A verificação das mensagens mais retuitadas e dos links mais compartilhados revela a multiplicação dos centros emissores de informação. No entanto, a visibilidade, e sobretudo a sua frequência, depende muito do seu número de seguidores nas redes sociais, ainda que pessoas variadas e sem grande audiência tenham possibilidade de ser visibilizadas. “Essa visibilidade impacta no debate público”, avalia a pesquisadora.
A parte final da tese aborda algumas questões políticas e no campo da comunicação que emergiram no Brasil após os movimentos de 2013. “Os ataques aos meios de comunicação se intensificaram muito”, afirma Santos, que vê nesses ataques que procuram deslegitimar o papel dos meios de comunicação, e também da ciência, dos intelectuais e das universidades, uma ação que contribui para a propagação das fakenews.
Filha de professores e neta do geógrafo Milton Santos, Nina lembra das inúmeras palestras que pôde acompanhar do avô e da inspiração para seguir na carreira acadêmica. Destaca o livro “Por uma outra globalização – do pensamento único à consciência universal”, de 2000, em que Milton Santos aborda, entre outras coisas, questões referentes à apropriação da técnica e seus usos. As repercussões das novas tecnologias seguem motivando o interesse das suas pesquisas hoje.
A cerimônia de entrega do prêmio está prevista para março do próximo ano, se houver condições sanitárias para a realização do evento presencial. A sua tese também foi indicada pela Universidade ao Prêmio Chancellerie des Universités de Paris, na categoria da premiação em letras e ciências humanas “todas as especialidades”, em que concorre ao título de melhor tese de Paris.