Estudantes em vulnerabilidade socioeconômica, negros, indígenas, quilombolas, com deficiência, trans e refugiados da Universidade Federal da Bahia são os principais afetados pelo corte de R$ 7,2 milhões nos recursos destinados à assistência estudantil. De acordo com a pró-reitora de Ações Afirmativas e Assistência Estudantil (PROAE), Cássia Virgínia Bastos Maciel, a redução das verbas atinge “o atendimento a 28 mil estudantes que acessam auxílios, bolsas, residência, creche, restaurante e Buzufba”, sendo que “mais de 4.684 estudantes e suas famílias já tiveram auxílios reduzidos”.
As constatações integraram o bloco voltado às “Ações Afirmativas e Assistência Estudantil”, durante o ato público nacional Educação Contra a Barbárie, realizado na manhã de 18/05, com manifestações da pró-reitora Cássia Maciel e também da deputada federal e servidora do Hospital Universitário Professor Edgard Santos, Alice Portugal; do presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Iago Montalvão; dos representantes estudantis do Diretório Acadêmico dos Estudantes (DCE/UFBA), Arlindo Pereira Neto e Raquel Souza Franco; do coordenador da Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnico-Administrativos em Instituições de Ensino Superior Públicas do Brasil (Fasubra), Toninho Alves e da representante do Sindicato dos Trabalhadores Técnico-Administrativos em Educação das Universidades Públicas Federais do Estado da Bahia (Assufba), Lucimara Cruz – convidados pelo reitor João Carlos Salles para apresentar suas considerações sobre a questão.
O entendimento de que os cortes de recursos voltados para essa área são um “ataque perverso” foi consenso entre os oradores. O reitor João Carlos Salles explicou que “ao retirar esses recursos que se dirigem à assistência estudantil, estão impedindo a ação pela qual a universidade tem recursos para diminuir, em seu espaço, as marcas da exclusão que os estudantes em vulnerabilidade sofrem fora da universidade”.
“É um ataque que atinge a todos na Universidade, não só aqueles que entraram por reserva de vagas e aqueles que vivem em vulnerabilidade socioeconômica”, afirmou a pró-reitora Cássia Maciel, enfatizando que “esse corte é a negação dos direitos e das expectativas legítimas de vida de um povo que ama o conhecimento e a universidade”.
O estudante Arlindo Neto, representante do DCE/UFBA, reconheceu que “os sujeitos que mais são atingidos pelos cortes dos recursos para assistência estudantil são os estudantes “pretos, pobres, quilombolas, indígenas”, o que aumenta “o índice de evasão, devido à ausência de garantias para a permanência, levando à crise política, sanitária e social”.
“Nossa educação, nossos sonhos e nosso futuro não podem ser interrompidos. Os estudantes necessitam da assistência estudantil para permanecer na universidade”, reivindicou a estudante também integrante do DCE, Raquel Franco. Ela lamentou que, “em vez das bolsas, no valor de R$ 400, terem sido reajustadas, tiveram o valor reduzido para R$ 200, de modo que fosse possível manter a todos com o auxílio na UFBA”.
Risco às ações afirmativas e cotas
A deputada federal e servidora do Hospital Universitário Professor Edgard Santos (Hupes), Alice Portugal, considerou o corte de recursos para as universidades como uma ação “proposital”, para que a “diminuição atinja duramente a assistência estudantil e tenha reflexos no sistema de cotas”.
As ações afirmativas – cotas e assistência estudantil – “são políticas estratégicas para o desenvolvimento social, pois buscam reparar iniquidades e transforma o saber acadêmico, referenciando-o socialmente”, afirmou a pró-reitora Cássia. “A inclusão neste espaço é o caminho democrático pois centraliza a diferença como nossa maior potência”, disse ela.
Neste ano em que se completam “17 anos de aprovação do programa de ações afirmativas na UFBA, que vem funcionando e democratizando o acesso à universidade, os corte e ataques não têm acontecido à toa, pois representantes do povo estão dentro das universidades, ocupando suas cadeiras e produzindo conhecimento, aliado à construção de um projeto de país”, acrescentou o estudante Arlindo Neto.
Por isso, o “momento é muito difícil para a educação brasileira, para a sociedade como um todo e todo o país”, reconheceu o presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Iago Montalvão. Para ele, “não dá para aceitar que a educação não seja uma prioridade num país com o potencial que o Brasil tem”, pois com “a retirada de recursos, vem o retrocesso em tantas conquistas que tivemos de ampliação do acesso à universidade e, principalmente, da luta pela permanência dos estudantes nas universidades”, alertou Montalvão.
O presidente da UNE lembrou que, durante muitos anos, as universidades foram reservadas para os filhos das elites, afirmando que a universidade é sim, lugar do povo, pois, quando o povo entra na universidade, a universidade muda. “E se nós queremos mudar o país, o faremos com esse povo produzindo pesquisas, projetos de extensão e trazendo a cultura e a sabedoria popular também para dentro das universidades”, afirmou.
Prejuízo ao povo brasileiro
Os oradores destacaram que neste momento de pandemia, as universidades públicas se dispuseram a produzir pesquisa, equipamentos de proteção, vacina e estocar suprimentos de imunizantes para salvar a vida dos brasileiros. “A universidade e a ciência salvam vidas e cortar recursos para a educação é também prejudicar a vida do povo brasileiro”, enfatizou Montalvão.
O coordenador da Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnico-Administrativos em Instituições de Ensino Superior Públicas do Brasil (Fasubra), Toninho Alves, também pontuou que a “conjuntura é de desmonte do estado brasileiro e da educação pública”, pois “não há um projeto pensado para a universidade brasileira como um polo da ciência e tecnologia. A universidade é do povo e é preciso retomar o papel fundamental da universidade pública”.
Em seguida, a representante da Assufba, Lucimara Cruz observou que “no momento em que os filhos do povo adentram a universidade, ela passa a ser um corpo que ameaça os autoritários e os brutos, por temerem a possibilidade de forjar a autonomia e independência do povo”. O reitor João Carlos Salles também considerou que “a universidade pública brasileira começa a incomodar as elites, exatamente quando diminui o déficit de representatividade e passa a se enriquecer com a cor e diversidade de nossa gente. E isso é intolerável”.