Em livro, professor da UFBA problematiza discurso de renovação do sistema capitalista

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Imagem da capa do livro

Desde o fim do século XX, o sistema capitalista tem reiterado o discurso sobre a necessidade de “adaptações” e “mudanças” nas relações de trabalho. Ao mesmo tempo, apresenta aos trabalhadores o dilema entre ter um emprego e lutar por seus direitos. E ainda defende o argumento de que os trabalhadores são responsáveis pela solução do desemprego, desde que aceitem as condições impostas pelo mercado.

A ideia que o capital presta, de maneira reiterada, de que ”é tudo novo” resulta de mobilizações retóricas para convencer o trabalhador de que é preciso se adaptar, já que, se ele se adaptar, irá proteger empregos e conseguir bons postos de trabalho. Mas, para isso, você tem que se “comportar bem” e “obedecer” ao capital. Resumindo, “é o desastre completo é a destruição completa do emprego”.

A opinião e as aspas são do professor da Faculdade de Economia da UFBA Vitor Araújo Filgueiras, que acaba de lançar, pela editora Boitempo, o livro “É tudo novo, de novo”, no qual analisa essa narrativa das “grandes transformações” apresentando seus argumentos e contradições, desnudando seus objetivos.

“Este livro busca apresentar e analisar as narrativas sobre o ‘novo’ mobilizadas estrategicamente pelo capital para criar surpresas permanentes, legitimando e ajudando a reproduzir e a radicalizar práticas empresariais e políticas publicas que atacam aqueles que vivem do trabalho. Pretendendo demonstrar que há uma linha de coerência e continuidade nessa tática. Desse modo, espero ajudar os agentes do campo do trabalho a problematizar esse longo circulo vicioso”, declara o autor, na apresentação do livro.

Para o pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho (Cesit/IE/Unicamp), professor José Derin Krein, que assina o prefácio da publicação, o livro é muito didático e, baseando-se em pesquisas “muito fortes” e rigorosas, coloca os argumentos de forma muito precisa, construindo uma obra extremamente consistente. “Acho que é um livro imprescindível para o nosso debate”, resume Derin Krein.

“É tudo novo”, de novo, tem cinco capítulos. O primeiro apresenta algumas narrativas empresariais, disseminadas principalmente entre os anos 1980 e 1990, sobre as grandes mudanças que estariam impactando o mundo do trabalho e suas supostas consequências.

O capítulo 2 demonstra o surgimento, a partir dos anos 2000, de narrativas que atualizam e radicalizam os discursos anteriores sobre transformações que afetam o mundo do trabalho. No terceiro, são analisadas a coerência e as consequências das narrativas e das práticas defendidas por elas. No capítulo 4, discute-se como as narrativa tem ajudado a criar um circulo vicioso de confirmação de seus objetivos. E o capítulo final apresenta diferentes iniciativas ao redor do mundo que resistem a essas narrativas.

Ilustração do livro no capítulo 2, página 64/ Sindicato de Bancários e Financiários de São Paulo, Osasco e Região (Spbancários), ” Publicidade escancara cinismo da direção do Santander”, Sindicato dos Bancários CUT, 19 set. 2017. Disponível online.

Importância da UFBA

Para a realização do livro, foi fundamental, segundo o autor, a pesquisa “Impactos da reforma trabalhista: comparação entre Brasil e Espanha”, realizada na Espanha, em 2020, em parceria entre a UFBA e a Universidade Complutense de Madri.

“A UFBA sempre fez parte de minha vida”, declara o professor Vitor Filgueiras. “Meus pais e vários outros familiares foram servidores da UFBA, por onde ando desde a tenra infância. Entrei na graduação de economia em 2001. Fiz mestrado fora e me tornei auditor fiscal do trabalho. Voltei para a UFBA no doutorado, em ciências sociais, em 2009. Sempre foi um dos meus planos de vida ensinar na UFBA”.

E continua: “Em 2017, fiz concurso para a faculdade de economia. Deixei a auditoria para exercer a docência com exclusividade. Sempre encarei como fundamental a tríade ensino-pesquisa-extensão, uma missão a ser efetivamente praticada pela universidade, e tenho buscado contribuir nessa direção. Desde que entrei na UFBA, dentre outros projetos que coordenei, há dois que estão em execução até hoje, congregando pesquisa e extensão, e foram importantes na consecução do livro, quais sejam: o projeto Caminhos do Trabalho e o projeto Vida Pós Resgate”.

O projeto “Caminhos do trabalho: tendências, dinâmicas e interfaces, do local ao global”, é parceria da Universidade Federal da Bahia (UFBA) com a Procuradoria Regional do Trabalho (PRT) da 5a Região, iniciado em 2017. Ele presta atendimentos médico e sociojurídico gratuitos aos trabalhadores e trabalhadoras com direitos previdenciários e trabalhistas lesados. O projeto já recentemente objeto de reportagem do Edgardigital.

Vitor Araújo Filgueiras (Foto: arquivo pessoal)

O projeto “Vida pós-resgate: trabalhadores resgatados em situação análoga à de escravos: investigação dos seus destinos e análise das políticas públicas de assistência”, também iniciado em 2017, é parceria entre a UFBA e a Procuradoria Geral do Trabalho. Com os recursos das indenizações pagas pelos empresários por submeter trabalhadores a condições análogas às da escravidão, o projeto irá comprar terras, insumos e demais meios para que os trabalhadores.