Perda linguística e contatos com línguas africanas são temas de mesa do Congresso 2023

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Salikoko S. Mufwene - Foto: Aristides Alves

Os efeitos da colonização e da globalização em relação às línguas originárias foram apresentados durante a mesa “Línguas e Colonização: Ensaios sobre Línguas e Globalização”, que reuniu os professores convidados Salikoko Mufwene, linguista congolês da Universidade de Chicago, e Alexander Cobbinah, linguista alemão da Universidade de São Paulo (USP), apresentados pela professora da UFBA Lilian Teixeira de Sousa. A mesa aconteceu no auditório do Instituto de Letras, no dia 15 de março.

A pesquisa atual do professor Salikoko S. Mufwene é em linguística evolutiva a partir de uma perspectiva ecológica, focada na emergência filogenética da linguagem e em como as línguas foram afetadas pela colonização e pela globalização, especialmente no que diz respeito à “indianização” das línguas europeias nas colônias e ao nascimento e morte linguística.

O tema da ameaça e perda linguística (LEL) reivindicou o centro das atenções na linguística desde o início dos anos 1990, embora as preocupações com esses processos remontem ao início do século 20, quando alimentaram o nascimento da linguística descritiva nos Estados Unidos.

Em relação às “línguas indígenas”, as razões denunciadas hoje foram originalmente relacionadas à expansão geográfica da colonização europeia impulsionada pelo capitalismo e pela ganância. Esses fatores econômicos levaram os colonos a desapropriar os povos originários de suas terras, colocando os indígenas nas margens das novas ordens socioeconômicas mundiais e tornando a troca linguística (“language shift”) uma condição necessária para que eles participem desta, explica Mufwene.

Para o linguista congolês, enquanto a globalização nos ajuda a abordar a questão da perda linguística de maneira comparativa em todo o mundo, bem como a questionar se esses processos são novos na história humana, uma abordagem evolutiva revela que eles são movidos por condições ecológicas locais, onde a globalização deve ser interpretada estritamente em termos de interdependência e interconectividade em relação às estruturas socioeconômicas locais. Nesse sentido, a abordagem evolutiva torna-se ainda mais reveladora quando o último meio milênio da expansão europeia é comparado com impérios pré-colombianos anteriores em todo o mundo.

Alexander Cobbinah - Foto: Ezequiel Santos

O bantu e o Brasil

Já a pesquisa atual do professor Alexander Cobbinah se volta para as línguas na África Central, tão importantes na história da formação do Brasil. Sua comunicação explorou pesquisas recentes sobre as línguas da família bantu, e mais especificamente as línguas deste grupo faladas na costa ocidental da África Central, nos atuais países do Congo e Angola.

Essas línguas tiveram um grande impacto na formação do português brasileiro pelo grande número de escravizados trazidos dessas regiões. Na última década, surgiram várias novas pesquisas que se dedicaram a elaborar e classificar as línguas bantus geneticamente, a esclarecer a situação dialetal das línguas do grupo kikongo e as dinâmicas de línguas francas usadas na África Central.

Segundo o professor, o conhecimento desses fatos permitirá pesquisadores trabalhando sobre contatos linguísticos entre africanos e outras populações no Brasil colonial a melhor situar e reavaliar os vestígios linguísticos de línguas bantu encontrados no português brasileiro em geral e em maior concentração em práticas linguísticas que se originaram, por exemplo em quilombos e nas religiões afro-brasileiras.

Os palestrantes

Nativo da República Democrática do Congo, Salikoko S. Mufwene é membro do Serviço Ilustre Edward Carson Waller de Linguística, do Comitê de Biologia Evolutiva, do Comitê de Estudos Conceituais e Históricos da Ciência e do Comitê sobre Estudos Africanos. É autor de várias publicações em linguística africana e crioula

Filho de pai ganês e mãe alemã, o professor Alexander Cobbinah nasceu na Alemanha, onde iniciou seus estudos em linguística africana. Seu tema de doutorado foram as línguas atlânticas, no Oeste do Continente Africano.

Lilian Teixeira de Souza - Foto: Ezequiel Santos

A professora Lilian Teixeira de Souza tem graduação em Letras pela Universidade Federal de Ouro Preto (2004), mestrado em Estudos Linguísticos pela Universidade Federal de Minas Gerais (2007), e doutorado em Linguística pela Universidade Estadual de Campinas (2012) com período de sanduíche na Universidade Livre de Berlim. Foi pesquisadora visitante na Universidade de Cambridge (2018). Atualmente é professora adjunta da Universidade Federal da Bahia, atuando na graduação e pós-graduação.