A UFBA concedeu o titulo de professor emérito a Ordep José Trindade Serra, professor aposentado do departamento de Antropologia e Etnografia da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (FFCH), em cerimônia realizada no dia 24 de março, no Salão Nobre da Reitoria da UFBA. A sessão solene de outorga, presidida pelo reitor Paulo Miguez, contou com as presenças da diretora em exercício da FFCH, Iole Vanin, e do professor Carlos Caruso, que apresentou junto com a professora Fátima Tavares a proposta de concessão da homenagem, que foi aprovada por unanimidade pelo Conselho Universitário. Também compareceram gestores públicos, parlamentares, líderes religiosos, representantes de diversas instituições de ensino, academias científicas, entidades de classe e movimentos sociais diversos.
“A UFBA é verdadeiramente minha alma mater“, disse Ordep Serra, traduzindo para a linguagem dos terreiros essa expressão latina muito consagrada: “Digo que a UFBA foi a mãe criadeira em minha vida”. “Foi em meio a deliciosa agitação cultural da UFBA que me politizei”, lembrou o professor, mencionando os espetáculos que frequentou nas escolas de artes da UFBA, ainda como estudante secundarista, no período que denominou de “renascença baiana”, liderado pelo reitor Edgard Santos, que fomentou com “uma explosão de criatividade” o circuito das artes e do pensamento, colocando a Bahia na vanguarda cultural do país.
“Essa cerimônia de hoje traz uma outra alegria que é compartilhada por todos nós. Afinal estamos deixando para trás tempos sombrios. Seja o tempo da pandemia, que impediu o abraço, mas seja essencialmente o tempo absurdo, da negação, do autoritarismo, do obscurantismo, de tudo aquilo que foi feito para tentar calar a nossa voz, a voz da casa chamada escola, chamada universidade”, declarou o reitor Paulo Miguez, que ressaltou as contribuições de Serra nas mais diversas funções e áreas do conhecimento.
Ordep Serra agradeceu a homenagem, ressaltando sua relação longeva com a Universidade, iniciada antes mesmo de seu ingresso como professor da FFCH, no início da década de 1980.”Me mantive, mesmo à distância, ligado a UFBA. Quando passei a integrar seu corpo docente, já tinha vivido com ela uma longa história de amor”.
Nascido em Cachoeira, Ordep Serra mudou-se para Brasília no inicio da década de 1960. Graduou-se em Letras, entre 1964 e 1969, na Universidade de Brasília. “Deslocou-se da Bahia para ir em busca do sonho de Brasília, juntamente com outros jovens ousados e aventureiros, para ali realizar seus estudos, num momento de grande encantamento pela novidade, pela nova cidade capital do Brasil, pelos sonhos de Darcy Ribeiro e Anysio Teixeira e, pelas oportunidades de renovação que se via no país que, lamentavelmente vieram a ser sufocadas pelo golpe militar e seus aliados civis. Mesmo diante dessa situação de intranquilidade e insegurança, na recém instalada UnB obteve seus primeiros títulos universitários”, destacou em seu discurso o professor Carlos Caruso.
Ordep cursou o mestrado em Antropologia, também na UnB, entre 1977 e 1979, defendendo a dissertação “Os Erês num Terreiro Angola”. É doutor em Antropologia pela Universidade de São Paulo (com passagem pela Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais, Paris) e Pós-Doutorado em Literatura e Cultura pela Universidade Federal da Bahia.
Caruso também lembrou a atuação do homenageado na coordenação de importantes projetos, a exemplo do Mapeamento de Sítios e Monumentos Negros da Bahia para o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), e a sua contribuição com estudos que redundaram no tombamento dos Tereiros de Oxumaré e o Kwe Vodun Zo. Ordep também esteve à frente da Associação Nacional de Ação Indigenista, do Conselho Memorial Zumbi, Fórum “A cidade é Nossa”, e coordenou o movimento Vozes de Salvador.
Em seu discurso, Ordep afirmou que “a prática da antropologia envolve necessariamente a luta pela dignidade humana. Implica em compromisso com os direitos humanos” e reforçou a necessidade do combate ao racismo e toda forma de discriminação, segregação e exploração.
O professor tem mais de uma centena de artigos publicados em revistas científicas e de difusão cultural, 25 livros como autor ou organizador, dezenas de orientações de mestrado, doutorado e supervisão de pós-doutorado. É membro da Academia de Letras da Bahia, da qual é o atual presidente. Também ocupou cargos na gestão pública, entre os quais o de diretor executivo do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC) e de presidente da Fundação Cultural do Estado da Bahia.
Ordep e a UFBA
“Ordep Serra nos remete sempre à imagem do destacado professor, nome de referência da UFBA no Brasil, atuante nas letras e na defesa da democracia, dos povos indígenas, das religiões de matrizes africanas, dos seus espaços sagrados e da memória social dos povos de santo”, destaca Messias Guimarães Bandeira, relator do processo de concessão do título na Comissão de Assuntos Acadêmicos do Consuni.
“Ordep é um exemplo pela sua militância e pelos estudos que produziu (…) A FFCH/UFBA se sente muito orgulhosa de ter Ordep Serra como professor, pesquisador e colega de profissão”, disse Iole Vanin, diretora da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas.
No início da década de 1980, Ordep Serra ingressou como professor da UFBA. Atuou na atividade docente na universidade em Sociologia, Antropologia, Arquitetura e Urbanismo, sendo requisitado por diversos programas de pós-graduação da universidade. É professor aposentado do departamento de Antropologia e Etnografia da FFCH. Atuou na gestão universitária, como Pró-reitor de Extensão da UFBA e chefe de Departamento de Antropologia.
“O Prof. Ordep José Trindade Serra personifica a figura do intelectual público, naquele seleto grupo cujas vozes são automaticamente mimetizadas em escuta refletida tamanha influência que podem exercer”, destaca Messias Bandeira em seu parecer. “Certamente Serra marcou e marcará inúmeras gerações de estudantes e colegas que agora apenas sistematizam, por meio desta emblemática honraria da nossa universidade, um precioso repertório de contribuições à UFBA e à sociedade”, acrescentou.
Foto da capa: Arquivo/ALB
Texto com informações no parecer do relator do processo e no relatório dos professores proponentes (Processo 23066.032655/2019-70).