Nos dias 3, 4 e 5 de julho de 2023, realizamos em Salvador-Bahia-Brasil o I Encontro Nacional de Cultura e Arte nas Universidades Federais Brasileiras, na Reitoria da Universidade Federal da Bahia. Nele, reafirmamos nosso compromisso com o desenvolvimento cultural, em especial das culturas brasileiras, e com a construção de um país mais justo, igualitário, diverso, soberano e democrático.
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A nação, a educação, as culturas, as ciências, as artes e todo povo brasileiro vivenciaram tempos sombrios nos últimos seis anos, desde o golpe de 2016 até o final de 2022. A atuação dos movimentos, instituições e agentes democráticos se mostrou essencial para a resistência e para a superação do retrocesso, que agrediu o país. As universidades públicas estiveram sempre entre as instituições nacionais mais perseguidas e atuantes na luta e resistência contra a barbárie, que se instalou no Brasil.
No novo tempo democrático de reconstrução da nação, as universidades federais afirmam seu papel de instituições culturais; reconhecem a presença da cultura em suas atividades de ensino de graduação e pós-graduação, pesquisa, extensão e inclusive de gestão universitária; criam patrimônios, artes e ciências em cultura; realizam estudos e constroem indicadores e dados sobre os campos artísticos e culturais; formam públicos e profissionais da cultura e das artes; trabalham para a preservação e promoção das identidades e diversidades culturais; ampliam os diálogos interculturais entre saberes e com as comunidades e territórios locais, regionais, nacionais e internacionais; constituem novas institucionalidades e políticas culturais; enfim assumem o compromisso primordial de produzir e difundir uma cultura democrática, tão necessária ao Brasil e ao aprofundamento da democracia no país.
As universidades federais brasileiras renovam seu engajamento com: a liberdade de criação e expressão artísticas e culturais; a pluralidade de opiniões; a diversidade cultural; as conexões com as comunidades e territórios; o reconhecimento dos saberes tradicionais como centrais na produção de conhecimento, em especial, de seus segmentos populares excluídos; os fluxos nacionais e internacionais de conhecimentos e a democracia cultural.
As universidades federais brasileiras se comprometem em ampliar ainda mais sua atuação política-cultural-educacional-artística-científica em benefício da nação e do povo brasileiro. Nessa perspectiva, reivindicamos que o Ministério da Educação e Ministério da Cultura estreitem suas relações cotidianas de diálogo, cooperação e intercâmbio com as universidades brasileiras, desenvolvam políticas compartilhadas em educação e cultura, de caráter continuado e permanente, e atualizem programas como o Mais Cultura nas Universidades, o Mais Cultura nas Escolas, além de outros a serem criados.
Os debates do I Encontro Nacional de Cultura e Arte nas Universidades Federais Brasileiras permitiram esboçar um programa inicial de ações e demandas para potencializar nossa atuação cultural. Tal programa é um horizonte para trilhar e deve ser atualizado em nossos encontros anuais. Nossa carta contém compromissos e demandas:
- Criar e/ou atualizar planos universitários de cultura e artes, em diálogo com o Plano Nacional de Cultura e com o Plano Nacional de Educação, buscando ampliar as atividades culturais e artísticas no âmbito universitário e nos territórios de presença das instituições, bem como sua cooperação com as comunidades culturais locais, regionais, nacionais e internacionais e sua articulação em rede cultural de universidades federais brasileiras;
- Fortalecer a institucionalidade cultural nas universidades brasileiras, reconhecendo a saudável diversidade de modalidades possíveis de institucionalização da cultura e das artes, garantido modalidades adequadas e flexíveis de organização da cultura e das artes nas instituições e a troca de experiências acerca dos processos de institucionalização cultural. Tais processos não podem prescindir de especial atenção com o aumento de docentes dedicados ao campo cultural e com a ampliação e aprimoramento da participação de seus quadros de técnico-administrativos em educação, incluindo a retomada dos cargos que foram extintos e/ou bloqueados.
- Avançar no processo de democratização do acesso e permanência de estudantes às universidades, em andamento, devido às políticas de ações afirmativas, potencializando sua repercussão no ambiente universitário, com a incorporação, reconhecimento e valorização de diversas culturas trazidas pelos grupos e classes sociais antes excluídos do ambiente universitário.
- Assumir uma perspectiva transversal da cultura, procurando garantir que ela atravesse todas as atividades universitárias e seja componente vital na formação de seus estudantes, técnico-administrativos e docentes.
- Afirmar o caráter democrático, engajado e estratégico na redução das desigualdades cumprido pela extensão universitária. A relação dialógica e profunda com os territórios, característica da extensão, reafirma as universidades como instituições culturais, que necessitam de orçamento adequado e equitativo para tais atividades.
- Contribuir para a compreensão do processo de inserção curricular da extensão na graduação como oportunidade de aprofundamento da formação cultural dos estudantes universitários, possibilitando aos discentes a transversalidade das manifestações culturais e a experimentação de formatos pedagógicos diversos das disciplinas.
- Ampliar a oferta de cursos de graduação e componentes curriculares em culturas, artes e patrimônio, em especial nas áreas em que as universidades federais ainda não possuem cursos.
- Desenvolver estudos, pesquisa e pós-graduação em cultura e artes, apoiando a implantação e/ou consolidação de programas de pós-graduação e de centros de pesquisa, por meio de ações das universidades e de projetos/convênios com o Ministério da Educação e o Ministério da Cultura, destinados a estimular os estudos de cultura e artes, a formação de estudiosos nesses campos e a divulgação dos produtos dos estudos.
- Demandar do CNPq, CAPES e Fundações de Amparo à Pesquisa que a pesquisa em cultura e artes seja melhor reconhecida e mais estimulada em seus programas de apoio, incluindo políticas específicas de fomento. Nesse sentido, as universidades federais brasileiras devem reivindicar aos organismos de fomento à pesquisa e pós-graduação, nacionais e estaduais, maior abertura e acolhimento aos estudos da cultura e artes, inclusive com a atualização de suas estruturas e mapas classificatórios de conhecimentos.
- Promover o acesso à cultura, garantindo também uma efetiva cultura do acesso que envolva a participação das pessoas com deficiência na formulação de políticas e programas nas universidades brasileiras, visando fortalecer a democracia cultural e a acessibilidade estética, poética e cocriativa.
- Afirmar a importância dos grupos/corpos culturais e artísticos estáveis nas universidades brasileiras também como laboratórios de ensino, pesquisa e extensão, mobilizadores desses campos, que produzem conhecimento através de práticas inovadoras e promovem abordagens epistemológicas específicas no âmbito da pesquisa em artes e da cultura. Eles necessitam, portanto, de condições em termos de recursos humanos e orçamentos adequados e proporcionais ao seu papel no contexto universitário.
- Fortalecer o papel dos órgãos e equipamentos culturais como espaços de convívio, produção de conhecimento, formação inicial e continuada não apenas no âmbito universitário, mas como rede capilarizada nos estados e municípios, capaz de promover a implementação das políticas públicas junto à sociedade. Propor a criação de financiamentos específicos para a manutenção dos equipamentos culturais, articulados com o Ministérios da Educação e o Ministério da Cultura.
- Afirmar o papel dos órgãos e equipamentos culturais, em especial museus, coleções e acervos, editoras, como estruturantes das universidades federais como instituições culturais, que contribuem para cumprir a missão da universidade pública.
A plenária sugere a criação de uma rede permanente e um circuito nacional entre as universidades federais, com vistas ao aprofundamento dos debates e a realização de ações em todos os campos das culturas e artes.
A plenária aprovou a sede para a realização do II Encontro Nacional de Cultura e Arte nas Universidades Federais Brasileiras na Universidade Federal do Ceará em 2024 e do III Encontro Nacional de Cultura e Arte nas Universidades Federais Brasileiras na Universidade Federal do Vale do São Francisco em 2025.
Somos a balbúrdia democrática e desejamos ser cada vez mais parceiros atuantes no desenvolvimento econômico, social, ambiental, político, educacional, cultural, científico, artístico e democrático, além de contribuir ativamente para que a barbárie não se repita nunca mais no país e no mundo.