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No terceiro e último dia de trabalhos do I Encontro Nacional de Cultura e Arte nas Universidades Federais Brasileiras, na quarta-feira, 5 de julho, as atividades começaram pela manhã, na Reitoria da UFBA com a mesa que reuniu Teodora de Araújo Alves (UFRN), Marcos Olender (UFJF), Gislana Maria do Socorro Monte do Vale (UFF), mediada por José Maurício Brando (UFBA) para falar sobre o tema “Corpos Artísticos Estáveis nas Universidades Federais Brasileiras”.
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A professora do Departamento de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e diretora do Núcleo Arte e Cultura (Nac), Teodora de Araújo Alves, declarou que o núcleo realiza um trabalho “bastante orgânico” com a pró-reitoria de Extensão da UFRN, no sentido de uma luta política na própria Universidade, para que se possa garantir o fomento às artes e à cultura naquela instituição. Teodora propõe que se pense coletivamente e que se liste, a partir do que é feito na universidade potiguar, pautas que possam interessar a outras instituições, respeitando-se a realidade de cada universidade, pensando-se mais na perspectiva do diálogo e das convergências.
Sobre o tema “corpos artísticos estáveis nas universidades federais brasileiras”, a professora afirmou que, na diversidade própria dessas instituições, o termo às vezes é utilizado em uma e não em outra. Na UFRN, por exemplo, ela cita, “a gente lá tem uma denominação de grupos consolidados de arte e cultura”. Mas ela se pergunta: “O que seria estável? Seria que de fato esses corpos estão tão estáveis nas universidades? Que desafios, que lacunas existem e que avanços também”?
Para Teodora, o intuito é refletir sobre as concepções e o papel da arte, da cultura e da educação como direitos constitucionais e trabalhar para qualificar as ações artísticas e culturais nas universidades, contribuindo para a democratização do acesso dos diferentes públicos e defendendo para que tais áreas não se restrinjam apenas ao entretenimento.
Já o professor titular da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e diretor do Centro de Conservação da Memória da UFJF, Marcos Olender, informou que a Federal de Juiz de Fora tem a primeira pró-reitoria de Cultura entre as universidades federais, “o que não quer dizer alguma coisa e, ao mesmo tempo, quer dizer muito, porque foi a maneira que encontramos de resolver a questão dentro da universidade: criando efetivamente uma pró-reitoria de Cultura”. Olender conta que, desde 2006, a UFJF já tinha o Museu de Arte Murilo Mendes o Cine Teatro Central, um coral e um Fórum de Cultura, entendendo-se então que era hora de a universidade criar uma pró-reitoria de Cultura.
O professor informou ainda que o incentivo chega a partir dos editais, de bolsas para grupos artísticos que são desenvolvidos por alunos e professores da universidade e que se tornam grupos artísticos estáveis. Cita como exemplos o grupo de professores e alunos que fazem mosaicos pela cidade e o coletivo de alunos que trabalham com a pesquisa e difusão da arte e “que só existe hoje muito incentivado pelas entidades da universidade, mas não é da universidade, [e sim] de alunos e ex-alunos”. Disse que, assim, as atividades são pautadas pelo cotidiano das comunidades, através de situações reais vividas pelas pessoas.
‘Corpos impossíveis’
Gislana Maria do Socorro Monte do Vale é doutoranda do programa de pós-graduação de psicologia da Universidade Federal Fluminense (UFF) e secretária adjunta do movimento brasileiro de mulheres cegas e de baixa visão. Ela pesquisa sobre Estética e Poética na Acessibilidade Cultural.
“Mas eu não sou um corpo estável, eu vou falar de corpos impossíveis, e para falar desses corpos impossíveis, diversos, divergentes, intrusos, eu preciso me apresentar do jeito certo para me entender comigo. Humildemente, eu digo que sou a sociedade civil sentada aqui nessa banca. Eu sou do movimento brasileiro de mulheres cegas e com baixa visão. Nós somos muitas mulheres, algumas estudadas como eu, algumas que nunca estudaram que são pessoas que vivem do benefício da prestação continuada (…). Somos os periféricos, os com deficiência, os negros, os indígenas”.
Gislana diz que ouve falar de alunos não querem mais ficar (nas universidades, segundo ela), mas, que é preciso falar dos alunos que não chegaram até lá, “as pessoas com deficiência, as pessoas pretas, as pessoas pobres, o povo indígena, agente não chega”, garante a pedagoga.
“Então tem que ter duas preocupações, sair desse momento de discussão da cultura pensando, esse outro povo que não chega, nem pode querer ficar porque não chegou não tava lá. E que os equipamentos de cultura e os equipamentos da universidade, os prédios públicos, eles não podem, por exemplo, colocar um piso tátil, um piso guia pra uma pessoa cega (…)… então se agente sair daqui e não pensar que esses equipamentos maravilhosos da cultura precisam ter um piso tátil, a gente vai sair falando de coisas que não têm diversidade”. Alerta Gislana.

Teodora de Araújo Alves (UFRN), Marcos Olender (UFJF), Gislana Maria do Socorro Monte do Vale (UFF), com mediação do professor José Maurício Brando (UFBA), falaram sobre o tema “Corpos Artísticos Estáveis nas Universidades Federais Brasileiras”. (Foto: Aristides Alves)
O Professor de Regência e regente titular da Orquestra Filarmônica da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Márcio Steuernagel, informou na sua fala que a Universidade Federal do Paraná tem hoje cinco grupos artísticos: a filarmônica, uma companhia de dança, a companhia de teatro, o grupo de MPB e o madrigal.
Ele disse que “A nossa justificativa e existência ela balança entre o precário e o sucesso e aqui eu tenho que fazer um parêntese porque eu sei que a Federal da Bahia é uma exceção, que aqui os grupos artísticos estão no DNA da fundação da universidade e que eles têm uma integração forte com o ensino. Mas em muitas outras federais chamar esses corpos de “‘estáveis” talvez seja otimista mas, verdade histórica no sentido de que foram criados e não foram extintos”.
O maestro acha que, no caso da maioria das federais, seria mais útil o reconhecimento de que o modo operante dos grupos artístico é mais disfuncional do que funcional, “é um arranjo dentro de uma lógica que não é nossa”. Para ele é preciso pensar a ascensão da pesquisa artística como campo epistêmico próprio e como espaço promissor nas universidades, o que inclui o papel dos grupos artísticos universitários. Sugere ainda um estudo específico sobre o que denomina de “trânsito de artistas”, integrantes de grupos nacionais que se deslocariam pelo país, declarando que esse trânsito é próprio da arte, e precisa de canais instituídos para “correr em estruturas propriamente artísticas, ao invés de parasitar estruturas universitárias que afinal foram criadas para outros fins correlatos, mas não artísticos”, na opinião de Steuernagel.
Ao encerrar os trabalhos da mesa, o diretor da Escola de Música da UFBA e coordenador artístico da Orquestra Sinfônica e do Madrigal da UFBA, José Maurício Brandão, informou que “corpos artísticos estáveis”, é um termo muito próprio da UFBA, em razão da instituição, ao longo da sua história, ter se tornado uma universidade como várias escolas de arte, como Dança, Música, Teatro e Belas Artes.
“Mas, no caso da UFBA, nós não nascemos escolas, nós nascemos seminários, nós nascemos livres e, curiosamente, nesse nascedouro livre, nasceram os corpos artísticos, e nós passamos a usar na UFBA o termo “grupo estável” para designar esses conjuntos. Então é claro que para outras universidades, o termo soa estranhíssimo, mas não é estranho para nós. A ideia de estabilidade nada tem a ver com aquilo que é a nossa maior certeza, que é a certeza da não estabilidade”, explicou Brandão.
Equipamentos culturais
No turno da tarde, a mesa “Equipamentos culturais nas universidades brasileiras” reuniu Alexander Álvaro Malaguti (RNP), Marielle Costa (Ibram) e Marcelo Cunha (UFBA), mediada pelo diretor da Escola de Dança da UFBA, Antrifo Ribeiro Sanches Neto.
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Alexander Álvaro Malaguti, bacharel em geografia, trabalha, desde 2009, na Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP), organização social vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações. Ele, que é o gerente de relacionamento com as comunidades de cultura, artes e humanidades, explica que sua atividade é justamente acompanhar essas comunidades e entender suas especificidades.
“Quando agente dá um zoom naquilo que a gente tem ali nas instituições superiores de educação e pesquisa aí agente descobre “caramba, tem museu”, “caramba, tem arquivo”, “caramba, tem orquestra” “caramba, tem cinema”… e “meu Deus, tem biblioteca”. Malaguti acredita ser importante a reflexão sobre a necessidade de avançar para outros modelos de sustentação que não dependam exclusivamente do financiamento ministerial, mas que se organizem enquanto comunidades, de modo que “todos nós possamos usar todos os atributos de forma compartilhada”.
Para Marielle Costa, licenciada em artes visuais e servidora do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), a surpresa com a existência desses equipamentos culturais, como museus e cinemas não se dá apenas entre gestores, mas acontece também em vários outros âmbitos. Ela se apropria da expressão “caramba”, da fala de Malaguti, para lembrar, por exemplo, o espanto do próprio MEC com o incêndio no Museu Nacional na UFRJ.
Costa chamou ainda a atenção para uma dificuldade que se tem de se pensar essas questões dos equipamentos de uma forma mais dinâmica, “menos cartesiana”, citando como exemplos espaços como um museu universitário, ou um cinema, ou um teatro dentro da universidade e as suas infinitas possibilidades formativas. ”Até para um aluno de administração seria ótimo saber como se desenrola a gestão de um espaço como esse (…) Se dentro de um museu o trabalho de conservação e restauração de acervos, pudesse envolver alunos de química, seus professores…”, vislumbrou.

Mesa “Equipamentos culturais nas universidades brasileiras” com Alexander Álvaro Malaguti (RNP), Marielle Costa (Ibram) e Marcelo Cunha (UFBA), mediada pelo diretor da Escola de Dança da UFBA, Antrifo Ribeiro Sanches Neto.
Para o professor do Departamento de Museologia da UFBA e atual coordenador do Museu Afro Brasileiro da UFBA, Marcelo Nascimento Bernardo Cunha, é lamentável que o incêndio no Museu Nacional em 2018 tenha sido responsável por todo um “movimento” que, na verdade, segundo ele, só faz evidenciar os problemas pelos quais passam os museus, entre outros equipamentos culturais e artísticos das universidades brasileiras.
Com a criação, em 2018, pela Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), do GT dos Museus, começa uma pareceria com a Secretaria de Educação Superior (SESU) e o Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM). Em 2019 o TCU, lança um acordo que, segundo Cunha, “só dizia basicamente o seguinte: que o Ministério da Educação adote as medidas cabíveis com vista a efetiva elaboração de plano de ação para implementação de mecanismo, supervisão, coordenação e orientação dos museus sobre a responsabilidade das universidades federais, atentando especialmente para a segurança dos prédios e dos acervos dos museus”.
Encerrando a mesa, o diretor da Escola de Dança da UFBA, Antrifo Ribeiro Sanches Neto, declarou que, apesar dos inúmeros desafios, “nós somos pessoas criativas, que investem no trabalho, sempre pensando no que a universidade pode oferecer para a sociedade. Mas muitas vezes a gente faz isso com pouquíssimas, com condições muito ruins. (…) eu sinto que nós temos grandes dificuldades nesses espaços, nas manutenções desses espaços, fora a questão financeira de aporte”, encerrou.